Tempo de ter tempo

julho 04, 2019

 

Profissional, esposa, mãe, dona de casa, cozinheira... Se fizermos um recorte na vida de uma mulher comum, em poucos momentos listamos uma quantidade sem fim de papéis a desempenhar. Mas não é só isso. Com maior ou menor intensidade estes tantos afazeres vêm rodeados de cobranças internas e externas: desempenhar-se de forma competente, ser uma pessoa culta e atualizada, bem cuidada, bonita, de alto astral... Haja mulher para tudo isso!

 

Nesse encadeamento de responsabilidades que parecem ficar em fila aguardando seu momento de entrar em cena, nos perguntamos onde fica o tempo para sermos simplesmente a pessoa que queremos ser, para resgatarmos o que há de mais verdadeiro em nosso eu, a nossa essência. Qual seria o principal papel dentre tantos que a vida nos traz? Será que deveríamos acabar semelhantes às máquinas? O que estamos buscando neste dia a dia atribulado, qual é o objetivo de tudo isso? E do que sentimos falta naquele raro minuto de silêncio, em que sentimos algo como uma quase tristeza, algo como uma saudade de nós mesmas?

 

Diz Louise Bogan, citada no livro Simplicidade e Plenitude de Sarah Ban Breathnach: “... num tempo carente de verdade e de certeza e repleto de angústia e desespero, nenhuma mulher deveria se envergonhar por tentar restituir ao mundo, através do seu trabalho, uma parcela do coração que esse mundo perdeu”. Talvez esta frase simples diga muita coisa. Talvez este seja um dos principais e dos mais esquecidos papéis da mulher hoje e sempre: ser uma âncora de algumas virtudes maiores e de uma paz que vão sendo esquecidas, deixadas para entrar em cena amanhã.

 

A escravidão nos moldes antigos acabou. Mas quantas outras formas de escravidão será que nós mesmas não estamos construindo? A escravidão da moda, da vaidade, de padrões e slogans publicitários não poderia denunciar uma certa insegurança, algum tipo de lacuna interior?

 

Na natureza, em geral, os machos têm alguma característica especial, são mais bonitos, mais coloridos ou cantam melhor do que as fêmeas, pois precisam tornar-se atraentes para elas. O pavão, com todo o seu colorido exuberante, e o leão, com a juba poderosa, são apenas alguns exemplos de machos muito mais expressivos do que as fêmeas da mesma espécie. Por que com os humanos precisa ser tão diferente? No livro O Valor da Mulher, Marianne Williamson questiona: “E por que estamos sempre tentando, de qualquer maneira, descobrir como ser mais atraentes para os homens? Por que eles não se esforçam um pouco e tentam descobrir como se tornarem atraentes para nós mulheres?”

 

Outro aspecto a se refletir é que, até pouco tempo, a mulher não podia trabalhar fora. Hoje, parece que vale o contrário. Aquelas mulheres que podem e querem cuidar exclusivamente da casa e dos filhos assumem isso com tranquilidade? Ou será que existe um certo preconceito velado que desvaloriza este tipo de atitude? Não seria este também um padrão escravizante que criamos? “As mulheres continuarão a ser oprimidas, social e politicamente, até reconhecermos que os papéis tradicionalmente atribuídos às mulheres estão entre os mais importantes da sociedade”, diz também Marianne Williamson.

 

Talvez quem precise dar o primeiro passo em busca da valorização da mulher seja ela mesma. Não somente em relação aos papéis que desempenha dentro ou fora de casa, mas também em relação a como projeta o que é ser mulher para o mundo. Na corrida em busca da próxima cena, pode ser que o que esteja faltando para harmonizar o nosso cotidiano sejam alguns minutos a mais de silêncio e introspecção. Um minuto exclusivamente nosso, um minuto de sensibilidade e de resgate... um minuto do espírito.

 

Texto revisado, publicado no periódico Literatura do Graal, número 4.


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