Da varanda do primeiro andar, vejo a copa do chapéu-de-sol(Terminalia catappa), árvore que deve ter vindo da Índia ou Nova Guiné para povoar boa parte do litoral brasileiro.
Sua copa carrega uma floresta de erva-de-passarinho, planta parasita que ataca árvores tropicais, sugando sua seiva e podendo levá-las à morte.
As copas das árvores carregam muitas coisas. No quintal de casa, enraizadas aos galhos altos do antigo abacateiro moram pequenas bromélias, algumas orquídeas, um tipo de samambaia. Plantio de aves e insetos.
Ao visitar um pau-brasil de 600 anos descoberto na Bahia, o botânico Ricardo Cardim disse que precisaria olhar a copa da árvore com a ajuda de umdrone porque é bem provável que aquela copa abrigue mais espécies do que uma floresta europeia.
Afinal, a árvore centenária interagiu com a biodiversidade da Mata Atlântica, acolhendo sementes dispersadas e ventadas até sua copa, desde que a floresta ainda era floresta preservada, antes da chegada do europeu.
Pássaros e insetos plantam floresta onde tiver chão e para eles o chão é mais amplo do que aquele onde pisamos. Dispersores de sementes, eles não escolhem território, seguem insistentemente semeando. Até capô de carro eles tentam fertilizar.
E as copas das árvores podem ser território fértil, solo acolhedor para a semeadura. As cabeças das pessoas também. Muitas semeaduras são sempre de novo abrigadas e acolhidas nas nossas mentes. Podemos nutrir semente benfazeja ou também erva-de-passarinho. Assim, cresce em pensamento uma floresta nativa de diversidade com efeitos grandiosos ou uma floresta parasita que drena nossa energia e ainda prolifera, podendo multiplicar outras sementes-parasitas ao vento.
Vejo uma azaleia pequena e noto que ela já é abrigo de uma bromélia que chegou pelas asas de alguém. A bromélia está crescendo com vigor, colaborando para enfeitar o corpo da azaleia, contribuindo com a biodiversidade. Quem sabe, quando ela crescer mais um pouco, poderá guardar água da chuva e se transformar em bebedouro de pássaros.
“Os muitos pensamentos turvam a visão, pois são como as densas névoas cinzentas que se levantam dos rios…”
Roselis von Sass, A Grande Pirâmide Revela seu Segredo
“Viver é experimentar exatamente isso: cuidar de uma pequena parte, de modo a agregar ao todo. Qual a nossa colaboração na transformação da energia que nos mantém vivos? Qual o melhor encaixe que podemos fazer de nós mesmos dentro de um sistema que já trabalha, por natureza, de forma colaborativa?”
Sibélia Zanon