Muitos praticam sem saber e muitos falam dela sem praticar.
Por excesso de repetição e talvez por mau uso, a gratidão parece ter-se esvaído de sentido e cor.
Equivocadamente misturada com obrigação, a gratidão autêntica tem seu abrigo na alegria.
Assim, a prática da gratidão está conectada ao gosto – o gosto de viver, o sabor do momento presente.
E para sentir os sabores, é preciso cultivar os sentidos: sentir o perfume, perceber o paladar, reaprender a atenção. Sentir implica em ser permeável, deixar-se tocar.
“O corpo não é somente uma matéria de sentido, mas o instrumento primeiro para apreender o mundo”, escreve David Le Breton.
Acordar os sentidos é um caminho para apreender o mundo com suas cores e gostos. E, quem sabe, então, encontrar ali, escondida na alegria, a gratidão.
“Emengal começou a falar:
— Quero expressar minha gratidão ao Onipotente! Exatamente como vós! Mas o que é gratidão? Alguém pode dizer-me o que entende por gratidão?
— Eu não sei o que é gratidão! disse um dos ajudantes. Posso, no entanto, dizer que nunca senti tanta alegria como durante o tempo em que me foi permitido colaborar. Talvez alegria signifique gratidão! Não sei bem ao certo, disse ele quase envergonhado.
— Mais alguém pode dizer-me o que entende por gratidão?
O mestre de metais levantou sua mão. Emengal acenou convidando-o a falar.
— Talvez seja gratidão sentir felicidade! Eu sempre fui feliz, desde pequeno. Feliz por me ser permitido trabalhar nos metais até o fim da vida. Feliz por me ser concedido conhecer o amor! Talvez a gratidão esteja escondida na felicidade e na alegria!
Depois, o homem baixou a cabeça, sentando-se de novo.
— Vossas respostas me alegram, pois eu intuí que jamais tivestes nos lábios a palavra ‘gratidão’, mas sim que a gratidão esteve ligada a toda a vossa vida!”
Roselis von Sass, A Desconhecia Babilônia