Lembranças das águas

outubro 18, 2017

Imagem de concha com pérolas

 

Sibélia Zanon

 

Nem tudo o que existe a gente vê e nem por isso as coisas deixam de existir!

 

Era uma vez… Ao escutar a expressão somos levados para um passeio pelas paisagens da memória. Não a memória que habita a mente. Mas uma memória mais profunda, memória gravada na pele, no coração... Era uma vez pode suscitar “ternura saudosa para uns, felicidade melancólica, ou também silenciosos desejos irrealizáveis”, escreve Abdruschin.

Quais memórias gostaríamos de resgatar para o presente?

No livro Nina e a música do mar – Sereias, a menina pergunta: “Vovó, já experimentei água salgada e já vi um peixe, mas… onde estão as sereias?” O questionamento faz lembrar que, num tempo muito distante, os povos antigos tinham intimidade com a natureza, e as sereias não eram reminiscências de outras eras, mas elemento presente nas relações de gratidão e respeito que um povo construía com as suas águas.

A escritora Roselis von Sass conta em seus livros que as sereias, também chamadas de Ai-aras, Ondinas, Iaras, Mãe d’Água, entre outros nomes nas mais diversas culturas, são conhecidas por suas melodias encantadoras. Muitas vezes, suas músicas são dirigidas aos peixes, como expressão de estímulo e alegria ou ainda como advertência. O encantamento que a água e seus seres causavam nos povos antigos fazia com que fosse celebrada regularmente a festa da água.

 

“Cada ano celebravam-se várias festas em honra dos entes da natureza. No dia da ‘festa da água’, ofereciam-se presentes às ai-aras. Esses presentes consistiam em um óleo de aroma forte – extraído de madeiras e de flores aromáticas – e em colares de grãos coloridos de sementes.
O óleo espalhado nas águas onde moravam ondinas permanecia flutuando durante algum tempo na superfície. Durante esse tempo, a fragrância penetrava a pesada matéria terrenal, espalhando-se sobre a água onde moravam as ondinas. As ondinas alegravam-se com o perfume, aspirando-o profundamente como uma saudação do reino da terra…”

 

Os mares, rios e lagos têm música. A música das águas é também a música de seus inúmeros habitantes, visíveis e invisíveis. E se hoje fosse possível resgatar a intimidade com a riqueza da natureza, a gratidão pela abundância das águas e de seus habitantes, será que poderíamos voltar a escutar as diversas músicas das águas?

Era uma vez…

 

“No dia seguinte, Nina e Cabelinho acordaram bem cedo porque a primeira vez das coisas só acontece uma vez. Construíram obras de arte na areia. Sonharam com estrelas.”

Sibélia Zanon, Nina e a música do mar - Sereias



Leia Também

Quando a mentira veio ao Mundo?

novembro 05, 2024


O Livro do Juízo Final, de Roselis von Sass
Leia Mais
A grandeza da simplicidade

novembro 02, 2024


O ser humano tem de aprender finalmente que a verdadeira grandeza só se encontra nos acontecimentos mais simples e naturais. Que a grandeza condiciona essa simplicidade.

Assim é na Criação, assim é nele próprio, que a ela pertence como uma parte!”

Abdruschin, Na Luz da Verdade - Mensagem do Graal
Leia Mais
A arte de reconstruir

outubro 30, 2024


Os diversos tipos de dor, perda ou luto exigem alguma medida de reformulação. Quando se perde alguém querido, quando se perde uma habilidade, quando se perde algo que parecia fornecer esteio ou segurança… algo novo deseja ser delineado.

Nem sempre precisamos viver a perda para perceber a necessidade de alguma reconstrução. Não é preciso esperar pelos problemas graves para começar uma mudança. Perceber outras xícaras ruindo pelo mundo e covivenciar aquela dor pode ser um jeito de aprender e revisar o cuidado antes que um objeto escorra das próprias mãos.
 
Leia Mais